quarta-feira, 10 de julho de 2013

REDE Sustentabilidade - Nasce Um Novo Partido?

Queremos inteiro, não pela metade

@latino65Eis o que transforma as manifestações multicêntricas que eclodem pelo país numa inflexão histórica: todos os gritos, todos os cartazes, todos os sotaques, todos os dialetos das mais diferentes tribos dizem, em uníssono, que não querem mais democracia pela metade nem decisões tomadas num universo à parte, que se imagina automaticamente legitimado para decidir (ou não decidir), para fazer (ou não fazer), para planejar (ou não planejar) em nome de todos. As ruas dizem claramente: não será mais assim, não pode continuar sendo assim.
E dizem mais: queremos nos reconhecer nas decisões e nas ações de caráter público, não queremos ser expectadores. É nosso direito compartilhar o poder nas nossas diferenças, angústias, necessidades e expectativas.
Infelizmente, o governo e o sistema político tentam enquadrar essa energia nova e exigente dentro dos rituais da sua própria lógica, em cujo centro está o cálculo para as futuras eleições, não para as futuras gerações. Mas serão frustradas quaisquer medidas que pretendam instaurar processos sob controle dos governantes e do establishment político, que acostumou-se a agir, acima de tudo, em nome de sua própria sobrevivência.
Em suas inúmeras palavras de ordem e demandas, as mobilizações denunciaram o incontestável distanciamento entre as expectativas da sociedade e o que fazem as instituições políticas. Não se trata apenas de uma pauta de reivindicações. Tratá-las dessa maneira é aprofundar ainda mais o fosso dessa separação.
Não dá para que toda a efervescência das ruas caiba em cinco perguntas que a Presidente da República encaminhou ao Congresso como sugestão para realização de um plebiscito. Não podemos nos conformar com medidas pró-forma, habilmente arquitetadas para não mudar, ou pior, mudar para maquiar a continuidade do mesmo controle sobre o sistema decisório.
A reforma de que falamos é uma guinada histórica. Ela não pode ser tratada como a construção de uma cidade cenográfica, vazia por trás das fachadas imponentes. Como dizia o cartaz nas mãos de uma jovem manifestante brasileira: “são tantas coisas que nem cabe”. Ou a faixa esticada em Barcelona, durante as manifestações de 2011: “nossos sonhos não cabem nas suas urnas”. A reforma não pode ser essa ideia de um plebiscito amputado, que pode fazer com que a montanha de energia que vem das ruas acabe parindo um rato. É impensável jogar fora o tesouro de possibilidades que temos para dar um salto histórico na organização do Estado e no rumo de nosso desenvolvimento.
A Rede Sustentabilidade, que nasce numa realidade tão rica, defende a imperiosa necessidade de democratizar radicalmente a democracia, por meio de um novo ordenamento jurídico, econômico e social que sirva de base para um país verdadeiramente sustentável e justo.
Há uma agenda capaz de dar consequência às vozes múltiplas das ruas. Essa agenda passa necessariamente por ampla consulta à sociedade que incorpore estratégias de escuta presencial, como conferências e audiências públicas e também participação virtual, com todo o potencial que a internet oferece de diálogo e articulação de pessoas, redes e movimentos. E que esse processo deságue num espaço novo de reforma política que promova a integração das atuais instâncias de representação política com a participação popular, para identificar e consagrar novas regras para a convergência do sistema representativo com formas inovadoras e efetivas de democracia direta.
Só uma alternativa que incorpore – sem tergiversar – a voz que ecoou nas ruas pode representar avanço nessa direção, possibilitando o surgimento de temas novos, fora do controle desse sistema político que queremos reformar. Temas como as candidaturas independentes, para quebrar o monopólio dos partidos políticos sobre a política institucional; o fim da reeleição para os cargos do Executivo; a limitação a dois mandatos no mesmo cargo legislativo; e o fim do foro privilegiado. São essas, entre tantas outras, as ideias que poderiam surgir de um diálogo aberto e amplo com a sociedade.
Chegou a hora da participação de verdade, não do velho jogo de aparências.
É preciso autocrítica sincera e um ajuste de contas proporcional ao déficit de democracia que nos levou a esse momento.
Copyleft 2

Pão e circo não, obrigado!

Montserrat Martins*
Séculos de domínio das massas com o “pão e circo” viciaram os políticos em menosprezar a inteligência das pessoas. Bolsa Família e Copa do Mundo, ora vejam, não é tudo que o povo pode querer. “A gente não quer só comida”, já avisavam os Titãs há décadas, mas ninguém acreditou, porque a “geração Coca-Cola” parecia muito feliz consumindo videogames e o mais perto de um movimento de massas era uma lan house lotada jogando Counter-Strike uns contra os outros.

Há poucos anos meu sobrinho Pedro, na época com 12 anos e estudando História no colégio, desabafou que “tenho vergonha da minha geração”, pela passividade e adesão ao mero consumismo. “Inútil, a gente somos inútil”, desabafo do Ultraje a Rigor nos anos 80, era o sentimento do Pedro então. Agora a geração do Pedro pode se orgulhar, a inércia acabou e eles, os jovens, são os protagonistas.
Agora nossas ruas estão cheias de poesia e seus profetas foram os artistas que sonharam com esses momentos de rebeldia e inconformidade com a mesmice. “O dia vai raiar sem lhe pedir licença”, verso do Chico Buarque em música contra a ditadura nos anos 60, é um dentre milhares desses cartazes que os jovens usam, sem pedir licença. “Desculpem o transtorno, estamos mudando o país” é a mais linda ironia contra os avisos nas obras da Copa. “Os estádios estão lindos, falta construir um país em volta deles” é outro. “Queremos educação e saúde padrão FIFA”, uma maravilha. E que na face-linguagem, proclamaram: "O Brasil mudou seu status de deitado eternamente em berço esplêndido para verás que um filho teu não foge à luta".
Mas, dizem muitos, o que estraga é que existem vândalos infiltrados. Vândalos existem nas torcidas (lembre os Hooligans), existem em shows, bailões e bailes funk, em qualquer aglomerado onde o anonimato da multidão facilite o crime. Além de educação e saúde, nos falta uma segurança de qualidade, capaz de diferenciar vândalos de jovens que protestam. Ao invés de deter os violentos – o que exige preparo na função – há policiais fazendo o mais fácil, prendendo os pacíficos. Até para protestar em paz falta segurança cidadã, tanto quanto faltam saúde e educação.
Na alma do movimento legítimo não está depredar, ao contrário, está a defesa do patrimônio público que se esvai em obras faraônicas, em corrupção e mau emprego do BNDES, colocando o público a serviço do privado. O Barão de Itararé, expoente maior da inteligência pátria no século passado, satirizava os casos “tipo BNDES” da sua época dizendo que “a minha vida pública é uma extensão da privada”.
Os cientistas políticos ironizavam os protestos na rede como fantasias que jamais se concretizariam. Agora, não sabem como explicar movimentos novos e tentam enquadrá-los em padrões como “quem vai liderá-los?”. O que vai acontecer, ninguém sabe. Mas o que eles têm de novo é que são movimentos coletivos e contra qualquer forma de autoritarismo, a ponto de não terem líderes e rejeitarem a apropriação das causas pelos partidos.
Esse tipo de luta tem raízes na História nas propostas de autogestão hoje representadas pelos autonomistas, diferentes dos anarquistas pelos métodos pacíficos. Como na carta de Proudhon em 1846, rejeitando as concepções de vanguarda partidária de Marx: “Eu aplaudo, de todo o meu coração, vossa ideia de colocar em evidência todas as opiniões: façamos uma boa e leal polêmica, demos ao mundo o exemplo de uma tolerância sábia e previdente. Mas, porque estamos à frente do movimento, não nos tornemos como apóstolos de uma nova religião, mesmo que essa religião seja da lógica, da razão.” Os jovens mostram que a História não para e que há muitos desafios, no século XXI, para evoluirmos.
Artigo originalmente publicado no jornal Sul 21
*Montserrat Martins é médico e bacharel em ciências jurídicas e sociais.

IMPORTANTE: Os textos publicados na área de artigos do site www.brasilemrede.com.br refletem a opinião do autor e não um posicionamento da Rede Sustentabilidade.


MARINA SILVA

Em quase 30 anos de vida pública, Marina Silva ganhou reconhecimento dentro e fora do país pela defesa da ética, da valorização dos recursos naturais e do desenvolvimento sustentável.

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